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Quoting "Ha vida em markl"

Então parece que lá descobriram o melhor James Bond, hem?




É uma opinião arriscada, tendo em conta que Sean Connery é como um santo intocável no papel que lhe deu fama (e era um santo intocável inclusive para mim, que tenho como filme Bond favorito o Thunderball). Mas a verdade é que, se talvez ainda seja cedo para dizer que Daniel Craig é melhor que Connery, eu terei neste momento uns 98% de certezas disso. Não será por muito que Craig é o melhor, mas será por um bocadinho.

É claro que ele não está sozinho: se Casino Royale é um bom filme, não é só porque Daniel Craig é, de facto, um grande actor (citando Mr. T, “i pity the fools” que andavam a insultar Craig de bronco, sendo que certamente nunca tinham visto os bons filmes que ele tem feito - The Mother e Enduring Love são dois exemplos) que compreendeu a essência da personagem com uma profundidade tal que nem precisou caracterizar-se como o gajo moreno dos livros de Ian Fleming. Há um dos melhores argumentos Bondianos dos últimos tempos, facto a que talvez não seja alheia a presença de um escriba requintado como Paul Haggis (de Million Dollar Baby), vindo de um universo totalmente diferente e cujo dedo se nota em diálogos que nada têm a ver com o habitual simples e eficaz, trocadilho sexual para aqui e para acolá, que caracteriza a série.

Sou um fã que não condena o lado mais fantasioso das aventuras do agente, mas que não se importa que, de vez em quando, ele seja servido com uma dose generosa de realismo bruto e sangrento. Casino Royale é bruto e razoavelmente sangrento (ou não fosse beber a inspiração a um dos livros de Ian Fleming, o que já não acontecia há que tempos) mas também sabe ter uma espécie de inesperada poesia negra. Se pensarmos em volumes anteriores da saga, Casino Royale parece estar para os momentos mais fantasistas do passado como a BD The Dark Knight Returns, de Frank Miller, está para a série televisiva dos anos 60 de Batman. Há alturas em que Casino Royale parece 007 reinventado, precisamente, por Frank Miller, tal é a canalhice e o negrume de algumas sequências como a perversamente cómica tortura que o vilão Le Chiffre aplica a Bond. Não há gadgets mirabolantes (a não ser que os telemóveis contem para essa categoria), não há armas doidas a sairem da viatura (os carros limitam-se a andar, e depressa), e o vilão, que tem o belo nome de Le Chiffre (um espectacular Mads Mikkelsen que já fez filmes do Dogma para Lars von Trier, na sua Dinamarca natal) não tem nenhum plano megalómano, nem nenhuma arma alucinante capaz de fazer explodir o planeta - quer dinheiro e poder. E fará tudo para o ter, apesar de ter um problema de asma e de chorar lágrimas de sangue.

São os detalhes de caracterização que também ajudam Casino Royale a ser bom. Um vilão que anda com uma bomba de asma é uma ideia deliciosa. Mas há mais pormenores que agarram o espectador e o envolvem naquele universo durante duas horas e meia. E há a primeira história de amor realmente convincente (e desconcertantemente poética, sem trair o espírito abrutalhado e másculo da saga) dos filmes de 007. Já tinha havido uma bastante convincente e trágica, em Ao Serviço de Sua Majestade, mas parte da intensidade perdeu-se na altura porque é esse o tal filme em que George Lazenby foi James Bond. A química entre Craig e Eva Green, actriz que se espera que comece agora a fazer fitas de gabarito (uma das últimas dela foi o algo empastelado Kingdom of Heaven do meu outrora querido Ridley Scott) é assinalável. E ela é deslumbrante. E muito, muito “cool”.

A cada passo de Casino Royale subvertem-se e reinventam-se os lugares comuns da série. O pré-genérico, tradicionalmente uma sequência explosiva de acção, é um diálogo curto e grosso entrecortado por porrada da mais seca, filmada em preto-e-branco cheio de grão. O tema da série não toca na famosa imagem de Bond passando pelo orifício do cano da pistola, sendo que essa imagem icónica também é usada de maneira diferente. O genérico animado não tem mulheraças, apenas bonecos sem rosto, aos tiros, desfazendo-se uns aos outros em naipes de cartas ao som da canção de Chris Cornell e David Arnold (estava à espera que a canção resultasse melhor no filme mas não há dúvida que não é dos melhores temas Bond, ficando-se por ser apenas eficaz). Interessante é que estas novidades podiam transpirar um certo “ó para nós armados em diferentes”, mas o que é certo é que isso não acontece. Papamos tudo aquilo à medida que Martin Campbell, o realizador (de Goldeneye), nos vai servindo tão inesperadas iguarias, com uma fluidez, uma elegância e uma dignidade tais que rapidamente nos habituamos a esta nova era de aventuras de James Bond.

Sei que normalmente o fenómeno 007 é algo que ou se adora ou se odeia; Casino Royale é daqueles momentos da série em que, de facto, ela pode começar a conquistar novos fãs. Assim eles se convençam de que as coisas mudaram, e vão descobrir um “thriller” de espionagem por vezes de ressonâncias Hitchcockianas puras, inteligente, bem escrito, filmado e montado. Diria mesmo que, sem deixar de fazer a felicidade dos fãs de longa data, como eu, Casino Royale é o filme de 007 para as pessoas que não gostam de filmes de 007.

in Ha Vida em Markl

Sou um aficcionado dos filmes de James Bond. No entanto não sou um grande crítico de cinema...mas o melhor é tratar de ir ver o filme. Vou ver se o consigo fazer!

Abraço

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